quinta-feira, 7 de dezembro de 2023

ENTREVISTA: AS ESCOLAS CONFESSIONAIS E PRIVADAS ESTÃO EM PERIGO?

 


Por Franklin Ferreira 07/12/2023 08:00

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Nota: os negritos foram adicionados por A. F. Parola

Como noticiado na Gazeta do Povo, a agenda ideológica do governo Lula para a educação já está sendo imposta, como ilustra o documento que servirá de base para as discussões da Conferência Nacional de Educação (Conae), a ser realizada em janeiro de 2024. As principais pautas no material que foi divulgado pela Presidência da República e pelo MEC são promoção da diversidade “de gênero e de orientação sexual”, sugerindo a formulação de “políticas pedagógicas e de gestão específicas para este fim”, a necessidade de uma contraposição urgente “às políticas e propostas ultraconservadoras”, garantindo a “desmilitarização das escolas”, “o freio ao avanço da educação domiciliar (homeschooling)” e “às intervenções do movimento Escola Sem Partido e dos diversos grupos que desejam promover o agronegócio por meio da educação”. Segundo o site do Fórum Nacional de Educação, a Conae “tem objetivos específicos, como avaliar a implementação do PNE vigente, subsidiar a elaboração do próximo PNE (decênio 2024-2034) e contribuir para a identificação dos desafios e necessidades educacionais”. Em vez de traçar estratégias para melhorar a qualidade da educação do país, o material do Conae está repleto de temas político-ideológicos, incluindo até questões sindicais, como piso salarial de professores. Recentemente, Mauro Meister, pastor, doutor em Literatura Semítica, professor de Teologia e diretor-executivo da Associação Internacional de Escolas Cristãs no Brasil (ACSI), publicou um vídeo alertando sobre os perigos dessas pautas para a educação brasileira:

CONVIDEI-O PARA UMA ENTREVISTA, para entendermos melhor o que é a Conae, o que ela pretende e suas implicações.

 

RECENTEMENTE, VOCÊ COMPARTILHOU UM VÍDEO EM SUAS REDES SOCIAIS ALERTANDO SOBRE OS RISCOS QUE A CONAE 2024 PODE REPRESENTAR PARA A EDUCAÇÃO CONFESSIONAL E PRIVADA NO BRASIL. O QUE O MOTIVOU A FAZER O VÍDEO?

 

Decidi publicar esse vídeo de alerta porque a Conae 2024 foi convocada no último mês de setembro por meio de decreto presidencial, para acontecer no fim de janeiro de 2024. E duas questões me chamaram a atenção: primeiro, eu percebi que, até o início deste mês, a convocação era praticamente desconhecida entre diretores e mantenedores de escolas privadas e confessionais. Em segundo lugar, o prazo foi muito exíguo. Uma conferência que propõe discutir a educação brasileira por meio de um Documento de Referência com quase 180 páginas e mais de mil parágrafos demanda um amplo debate. E não houve tempo para isso nos níveis municipais e estaduais. Temos mais de 5 mil municípios no Brasil e, em poucas semanas, a comunidade escolar e a sociedade civil deveriam conhecer, debater e propor algo. Isso é simplesmente impossível. A ideia de uma Conferência Nacional de Educação traz a impressão de que os temas do documento foram “amplamente discutidos”, mas isso não é verdade. As conferências municipais e estaduais já aconteceram, e muitos dos interessados na proposta e protagonistas na educação brasileira nem sequer tiveram a chance de se manifestar a respeito do documento. Vamos aguardar o documento modificado e comparar com o original para ver o quanto aconteceu de participação democrática. Eu gostaria de ter uma surpresa.

 

POR QUE A CONAE É TÃO IMPORTANTE?

 

A educação brasileira é regida por um conjunto de leis, começando pela nossa Constituição Federal de 1988, que delineia, em dez artigos, os princípios fundamentais para todos os níveis educacionais, desde a educação infantil até o superior. O artigo 214 da Constituição estabelece que “a lei estabelecerá o plano nacional de educação, com duração decenal, com o objetivo de articular o sistema nacional de educação em regime de colaboração e definir diretrizes, objetivos, metas e estratégias de implementação para assegurar a manutenção e desenvolvimento do ensino em seus diversos níveis, etapas e modalidades por meio de ações integradas dos poderes públicos das diferentes esferas federativas”. Em 1996 surge a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), que prevê a criação do Plano Nacional de Educação (PNE – artigo 9.º, I), o Conselho Nacional de Educação (CNE – artigo 9.º, IX, § 1.º) e outros órgãos para a gestão educacional nos diferentes âmbitos (municipal, estadual e federal). O Documento de Referência da Conae é elaborado pelo Fórum Nacional de Educação (FNE), instituído por uma portaria do MEC em 2010 e formalizado por lei em 2014, com a aprovação do Plano Nacional de Educação. A Conae é uma conferência que se propõe a refletir e direcionar os rumos da educação nacional. Ela é importante porque estabelece objetivos que, posteriormente, tendem a promover leis que regulam o funcionamento da educação no país.

 

O DOCUMENTO DE REFERÊNCIA, ENTÃO, TEM LEGALIDADE E FOI ELABORADO PELO FÓRUM NACIONAL DE EDUCAÇÃO, QUAIS ENTIDADES COMPÕEM O FNE?

 

O FNE é composto por órgãos vinculados ao Ministério da Educação e Cultura, além de outras instituições da sociedade civil. Sua recomposição foi determinada por meio de portaria do Ministro da Educação em março de 2023, integrando 39 entidades representativas, incluindo órgãos governamentais, entidades e movimentos sociais, além de alguns sindicatos e movimentos que nada têm a ver com educação. No entanto, a representatividade eletiva compreende apenas um representante de uma comissão do Senado e outro de uma comissão da Câmara dos Deputados. O que vejo como problemático é que o Documento de Referência apresentado reflete uma ideologia que contradiz o espírito da própria Constituição Federal. O artigo 206 da Constituição afirma que “O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: [...] III – pluralismo de ideias e concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino”. As propostas do documento, que abordam questões específicas sobre minorias, gênero etc., parecem impor uma visão única sobre todo o sistema educacional, advogando o princípio de pluralismo contraditório, que promove uma única perspectiva político-ideológica. Outro ponto de preocupação, manifesto em ata da reunião do FNE, é que o documento deveria expressar a construção de uma política de Estado para a educação e não meramente uma política de governo. No entanto, a ideologização do documento indica uma orientação governamental, não contemplando a representatividade da população.

O CONAE SERÁ COMPOSTO APENAS POR ESSAS ENTIDADES?

 

Não; existe um processo que aparenta ter amplitude democrática. Como mencionei antes, ocorreram reuniões em níveis municipais e estaduais (e no Distrito Federal), mas o tempo de discussão foi extremamente curto, o que não permitiu uma reflexão profunda nem alterações significativas no Documento de Referência. Ou seja, essas reuniões serviram mais para confirmar e legitimar o documento do que para debater e promover alterações. Algumas poucas mudanças poderão ser propostas nesse percurso, até chegar ao evento nacional, mas sem reais chances de alterações substanciais.

 

A conferência nacional contará com mais de 2 mil representantes vindos dos municípios, estados e órgãos representativos, ocorrendo em um período de apenas três dias. Essa grande reunião apresentará a versão do documento sobre o qual ficará estabelecido o Plano Nacional de Educação. Porém, qual seria a real possibilidade de uma assembleia com mais de 2 mil representantes refletir profundamente sobre as questões apresentadas em apenas três dias? Devemos lembrar que essas políticas orientarão a educação brasileira, pública, privada e confessional, pelos próximos dez anos!

 

No mínimo, o processo deveria ter um tempo mais estendido para considerar a ampla manifestação da sociedade civil, em vez de apenas confirmar um documento altamente ideológico. Há discrepâncias na representatividade atribuída. Por exemplo, os delegados por setores, num total de 299, incluem 27 instituições religiosas, 50 comunidades científicas de ensino e pesquisa e 96 movimentos de afirmação da diversidade. É evidente que o Documento de Referência carrega o peso dessa representação desbalanceada.

 

QUAIS SÃO OS PRINCIPAIS TEMAS APRESENTADOS NO DOCUMENTO DE REFERÊNCIA?

 

 

O Documento de Referência traz consigo sete eixos: 1. O PNE, como articulador do Sistema Nacional de Educação (SNE), sua vinculação aos planos decenais estaduais, distrital e municipais de educação, em prol das ações integradas e intersetoriais, em regime de colaboração interfederativa; 2. A garantia do direito de todas as pessoas à educação de qualidade social, com acesso, permanência e conclusão, em todos os níveis, etapas e modalidades, nos diferentes contextos e territórios; 3. Educação, Direitos Humanos, Inclusão e Diversidade: equidade e justiça social na garantia do direito à educação para todos e combate às diferentes e novas formas de desigualdade, discriminação e violência; 4. Gestão Democrática e educação de qualidade: regulamentação, monitoramento, avaliação, órgãos e mecanismos de controle e participação social nos processos e espaços de decisão; 5. Valorização de profissionais da educação: garantia do direito à formação inicial e continuada de qualidade, ao piso salarial e carreira, e às condições para o exercício da profissão e saúde; 6. Financiamento público da educação pública, com controle social e garantia das condições adequadas para a qualidade social da educação, visando à democratização do acesso e da permanência; 7. Educação comprometida com a justiça social, a proteção da biodiversidade, o desenvolvimento socioambiental sustentável para a garantia da vida com qualidade no planeta e o enfrentamento das desigualdades e da pobreza.

 

“NOSSAS CRIANÇAS, ADOLESCENTES E JOVENS, EM GRANDE MAIORIA, CONTINUAM INCAPAZES DE FAZER CONTAS E LER. COMO UM DOCUMENTO QUE PRETENDE ORIENTAR A EDUCAÇÃO BRASILEIRA NOS PRÓXIMOS DEZ ANOS MINIMIZA ESTA QUESTÃO?” Mauro Meister

 

Cada eixo é organizado em fundamentação, proposições e estratégias, temas bem complexos e com implicações de todos os tipos: didáticas, organizacionais, administrativas, orçamentárias etc. Para a discussão destes eixos, durante as conferências municipais, intermunicipais e estaduais, os participantes se reúnem em salas separadas para as chamadas “plenárias de eixos”. Nestes grupos, os participantes têm a oportunidade de contribuir para o Documento de Referência, propondo emendas objetivas, que podem ser: supressivas (removendo palavras ou expressões, por exemplo), aditivas (acrescentando palavras, expressões ou grupos ausentes no texto), substitutivas (troca de uma palavra ou expressão por outra, mantendo o sentido do texto) ou aglutinativas (unindo expressões com conteúdo semelhante). Segundo relatos de participantes dessas conferências, as contribuições não abrangiam críticas à fundamentação do texto ou alterações nas proposições e estratégias. Isso, em minha opinião, limita a concretização do intento do Documento de Referência, que seria a de utilizar mecanismos democráticos amplos, valorizando algumas visões minoritárias em detrimento de outras e, também, grandes segmentos conservadores da nossa sociedade.

 

PODE MENCIONAR EXEMPLOS ESPECÍFICOS DE QUESTÕES QUE CONSIDERA MAIS PREOCUPANTES?

 

Há diversas preocupações que surgem a partir do tom do documento, mas gostaria de destacar algumas em particular. No contexto geral do documento, há uma ênfase quase exclusiva na “educação de qualidade social” ou “educacionalmente referenciada” (Eixo II); contudo, a qualidade acadêmica recebe pouca atenção ou destaque. É de conhecimento que a formação acadêmica no Brasil é deficiente, considerando que patinamos entre os países que apresentam os piores índices educacionais do mundo, sem conseguir, por décadas, sair desta estagnação. Para ver isso, basta olhar o Pisa 2022, publicado no dia 5 de dezembro. O fato é que nossas crianças, adolescentes e jovens, em grande maioria, continuam incapazes de fazer contas e ler. Como um documento que pretende orientar a educação brasileira nos próximos dez anos minimiza esta questão?

 

 

No mesmo Eixo II, o parágrafo 254 declara: “Um Estado laico representa o secularismo no qual o governo mantém uma posição oficial de imparcialidade em assuntos religiosos, não demonstrando apoio ou oposição a qualquer religião. Logo, a educação pública deve seguir o princípio fundamental do laicismo. Já instituições educacionais privadas ou comunitárias podem qualificar-se como confessionais, seguindo orientações confessionais e ideologias específicas, o que não implica na educação tornar-se doutrinária”. Um primeiro problema no parágrafo é a confusão entre laicidade e laicismo. O Estado laico afirma-se neutro com relação à religião e admite a sua pluralidade. Já o laicismo é a aversão a religião. O Estado brasileiro não é laicista, mas laico. Neste único trecho em que as escolas confessionais são mencionadas no documento, o texto reconhece o que a LDB afirma e, ao mesmo tempo, diz o contrário, tirando da escola confessional sua liberdade. Qual seria a intenção do parágrafo ao incluir o termo “laicista” e dizer que a confessionalidade “não implica na educação tornar-se doutrinária”? O texto da LDB é bastante claro em seu artigo 19, § 1.º, ao afirmar que “as instituições de ensino mencionadas nos incisos II e III do caput deste artigo podem qualificar-se como confessionais, seguindo orientações confessionais e ideologias específicas”. Aparentemente, o texto do Documento de Referência do Conae parece querer manter somente a intenção de doutrinação unilateral. Isto implica que a garantia constitucional que assegura como princípio a “liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber” não se aplica a certos grupos.

 

 

Conforme abordado anteriormente, o Documento de Referência representa uma ameaça à autonomia das escolas confessionais no que diz respeito à sua confissão. Ele impõe ideias que confrontam a liberdade dessas escolas, especialmente no que se refere aos valores de diversidade defendidos. Eles colocam em risco a diversidade religiosa e confessional nas escolas. Especificamente as escolas confessionais cristãs, que seguem princípios bíblicos sobre família e sexualidade, encontram-se em risco, a partir das propostas presentes nos diferentes eixos do documento. Elas geram não apenas tensão, mas também impactos diretos na liberdade pedagógica e administrativa dessas instituições. Surge, assim, a necessidade de questionar a efetividade da liberdade de ensino diante de um contexto que parece restringir certos valores e perspectivas.

 

Outro ponto importante está no Eixo IV do documento, sobre gestão democrática do ensino. A insistência das propostas é no sentido de que as instituições de ensino escolham seus gestores por meio de eleições participativas e com pouquíssimo critério de competências para a seleção. O parágrafo 763 termina com a seguinte afirmação: “Ressalta-se assim a importância da garantia da gestão democrática também para a rede de ensino privada, tanto de educação básica como superior, haja vista que a materialidade dessa concepção nas redes de ensino pública e privada é essencial para a garantia e a manutenção das ideias e processos democráticos”. Em tese, escolas fora do sistema público teriam de escolher seus gestores por estes meios, em ingerência direta na sua natureza e meio de funcionamento.

 

“O Documento de Referência é a manifestação de uma filosofia de ensino que não tem como objetivo a melhoria da educação acadêmica no Brasil, mas apenas a inserção ainda mais forte de questões ideológicas, políticas e partidárias.”Mauro Meister.

 

VOCÊ ACREDITA QUE O ALERTA FEITO COM O VÍDEO ALCANÇOU O OBJETIVO?

 

Foi um começo, mas continua o apelo para que os interessados no futuro do Brasil conheçam esse documento, entendam suas consequências, chamem seus representantes para a arena do debate sobre a educação do nosso país e mostrem as consequências, no curto e longo prazo, caso essas políticas sejam implementadas. O caminho das propostas é um texto final, elaborado pelo MEC, que deve seguir para nossas casas representativas. Deputados federais, senadores, deputados estaduais, vereadores e membros do Poder Executivo de todos os níveis do governo precisam conhecer e se posicionar quanto a isto. O Documento de Referência é a manifestação de uma filosofia de ensino que não tem como objetivo a melhoria da educação acadêmica no Brasil, mas apenas a inserção ainda mais forte de questões ideológicas, políticas e partidárias. Ao ler a apresentação e introdução do documento isto fica muito claro.


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quinta-feira, 16 de novembro de 2023

COMENTÁRIOS RELATIVOS AO PNE (PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO) 2014-2024

 

A Lei N.º 13.005, de 25 de junho de 2014 aprovou o PNE – Plano Nacional de Educação com vigência por 10 (dez) anos, a contar da publicação desta Lei, na forma do Anexo, com vistas ao cumprimento do disposto no art. 214 da Constituição Federal.

O art. 214 da Constituição Federal reza:

 Art. 214. A lei estabelecerá o plano nacional de educação, de duração decenal, com o objetivo de articular o sistema nacional de educação em regime de colaboração e definir diretrizes, objetivos, metas e estratégias de implementação para assegurar a manutenção e desenvolvimento do ensino em seus diversos níveis, etapas e modalidades por meio de ações integradas dos poderes públicos das diferentes esferas federativas que conduzam a:         (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 59, de 2009)

I - erradicação do analfabetismo;

II - universalização do atendimento escolar;

III - melhoria da qualidade DO ENSINO;

IV - formação para o trabalho;

V - promoção humanística, científica e tecnológica do País.

VI - estabelecimento de meta de aplicação de recursos públicos em educação como proporção do produto interno bruto.         (Incluído pela Emenda Constitucional nº 59, de 2009)

 

A Lei N.º 13.005 que aprovou o PNE no seu Art. 2.º estabelece as diretrizes que diferem em alguns aspectos  (ASSINALADOS COM MAIÚSCULAS  E QUE FORAM ACRESCENTADOS OU ALTERADOS) do que havia sido estabelecido no Art. 214 da Constituição Federal.

Art. 2º São diretrizes do PNE:

I - erradicação do analfabetismo ;

II - universalização do atendimento escolar;

III - SUPERAÇÃO DAS DESIGUALDADES EDUCACIONAIS, COM ÊNFASE NA PROMOÇÃO DA CIDADANIA E NA ERRADICAÇÃO DE TODAS AS FORMAS DE DISCRIMINAÇÃO;

IV - melhoria da qualidade DA EDUCAÇÃO;

V - formação para o trabalho E PARA A CIDADANIA, COM ÊNFASE NOS VALORES MORAIS E ÉTICOS EM QUE SE FUNDAMENTA A SOCIEDADE;

VI - PROMOÇÃO DO PRINCÍPIO DA GESTÃO DEMOCRÁTICA DA EDUCAÇÃO PÚBLICA;

VII - promoção humanística, científica, cultural e tecnológica do País;

VIII - estabelecimento de meta de aplicação de recursos públicos em educação como proporção do Produto Interno Bruto - PIB, QUE ASSEGURE ATENDIMENTO ÀS NECESSIDADES DE EXPANSÃO, COM PADRÃO DE QUALIDADE E EQUIDADE;

IX - VALORIZAÇÃO DOS (AS) PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO;

X - PROMOÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO RESPEITO AOS DIREITOS HUMANOS, À DIVERSIDADE E À SUSTENTABILIDADE SOCIOAMBIENTAL.

 

RESULTADOS OBTIDOS NO PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO ATÉ 2022

Os resultados obtidos até 2022 podem ser vistos no   Painel de Monitoramento do PNE. Ver

https://app.powerbi.com/view?r=eyJrIjoiOGY5NWUyMDMtYzc0Mi00Y2Y5LTk3MmEtNThjMjJiY2NjNWExIiwidCI6IjI2ZjczODk3LWM4YWMtNGIxZS05NzhmLWVhNGMwNzc0MzRiZiJ9    que apresenta em detalhes a evolução de cada um dos 56 INDICADORES relativos às 20 METAS estabelecidas no PNE.

Um resumo desses indicadores pode ser visto no Quadro Resumo dos Indicadores do PNE. Ver Quadro_Resumo_Indicadores.xlsx (live.com)   https://view.officeapps.live.com/op/view.aspx?src=https%3A%2F%2Finepdata.inep.gov.br%2FanalyticsRes%2Fres%2Fpne%2Farquivos%2FQuadro_Resumo_Indicadores.xlsx&wdOrigin=BROWSELINK

Desses 56 indicadores:

  •       15 são assinalados como NA (Não Aplicáveis) quando não há meta definida para o indicador ou quando não é possível calcular o Nível de Progresso ou de Execução, por falta de um valor de referência ou de mais de uma mensuração;
  •      29 são inferiores aos valores que deveriam ser atingidos
  •      7 são valores negativos
  •       5 foram os indicadores que superaram as metas (três deles relativos à educação superior):

o   Indicador 11B – Participação do segmento público na expansão da EPT (Educação Profissional Técnica) de nível médio (previsto: 50%; valor atingido em 2022: 61%)

o   Indicador 13A -Percentual de docentes da educação superior com mestrado ou doutorado (previsto: 75%; valor atingido em 2021: 84,3%)

o   Indicador 13B – Percentual de docentes da educação superior com doutorado (previsto: 35%; valor atingido em 2021: 50,8%)

o   Indicador 14A – Títulos de mestrado concedidos por ano no País (previsto: 60.000; valor atingido em 2020: 60.019)

o   Indicador 18E – Percentual de municípios que possuem PCR (Plano de Carreira e Remuneração) dos profissionais do magistério (previsto: 100%; valor atingido em 2021: 100%)

sexta-feira, 6 de janeiro de 2023

Em democracia nada se cria, tudo se copia

Abaixo encontra-se uma transcrição integral do artigo do jornalista Fernão Lara Mesquita, publicado em 19 de novembro de 2021, disponível em https://vespeiro.com/2021/11/19/em-democracia-nada-se-cria-tudo-se-copia/  em que fala a respeito da democracia na Suiça e nos Estados Unidos da América.

Para quem não sabe quem é Fernão Lara Mesquita sugiro que acessem https://telecom-brasil.blogspot.com/2019/09/aprendendo-o-que-e-democracia-com.html

Quando a Constituição dos Estados Unidos foi ratificada, em 1788, a Confederação Suíça, estabelecida pelo Bundesbrief, o documento assinado pelos três primeiros cantões a se unirem para formar a primeira nação européia (e a única que jamais teve um rei) em 1º de agosto de 1291, já existia havia quase meio milênio.

O “Pacto do Mayflower” é o exemplo mais conhecido. E as Câmaras Municipais das vilas autárquicas perdidas nas “Índias” e no Brasil do antigo Império Português tiveram traços dessa característica. Mas o da Confederação Suíça é o primeiro modelo acabado da “democracia espontânea”, esse modo de grupos humanos isolados se organizarem consensualmente “entre iguais” para um objetivo comum.

Quando a Biblioteca do Congresso incorporou a biblioteca particular de Thomas Jefferson, os primeiros pesquisadores já registraram a presença com destaque de dois autores suíços – Emerich de Vattel e Jean-Jacques Burlamaqui (1694-1748, membro do Conselho de Estado de Genebra e professor de ética e natural law) – entre os volumes mais manuseados pelo autor da Declaração de Independência americana. Foi ela que, pela primeira vez, afirmou como “verdades auto-evidentes” que “todos os homens foram criados iguais” e estabeleceu como “inalienáveis os direitos à vida, à liberdade e à busca da felicidade” não segundo esta ou aquela fórmula estabelecida como “santificada” ou “correta” por terceiros, mas como cada um preferisse faze-lo. 

Naqueles volumes grifados e anotados à margem, estavam até frases inteiras reproduzidas na Declaração que iniciou a terceira jornada da democracia na Terra ao afirmar, na cara de um mundo de monarcas absolutistas hereditários detentores de poderes “atribuídos diretamente por deus” que, tudo mentira, “todo governo deriva os seus poderes do consentimento dos governados” e que “é direito e até dever desses governados corrigir ou abolir qualquer governo que se volte contra esses direitos inalienáveis”.

Com origem nos exilados das cidades-estado que viriam a constituir os reinos da Alemanha, da França, da Áustria e da Itália para a “Sibéria” mais próxima – aquelas montanhas inóspitas nas suas fronteiras comuns – a democracia suíça passara meio milênio como a única experiência divergente a sobreviver à margem do poder dos papas primeiro, dos reizinhos municipais depois, e dos monarcas absolutistas da Europa finalmente, graças à sua localização hiper-estratégica para o comércio europeu e às condições imbatíveis de defesa daquelas gargantas e “passos” nas montanhas que só eles conheciam e dominavam. 

Desde o primeiro minuto, portanto, os suíços viram na experiência americana o parentesco com a sua própria e entenderam a importância do sucesso dela para a vitória da democracia sobre a opressão reinante.

Havia batalhões suíços na Guerra da Independência e o “Kentuky-rifle”, arma decisiva dos colonos, evoluiu do Swiss-Jaeger. Henry Miller (Johan Heinrich Möller), estabelecido na Filadelfia em 1762 onde editava um jornal que fazia campanha pela entrada dos “alemães” americanos na guerra contra a Inglaterra era suíço. Seu jornal foi o primeiro a anunciar a Declaração da Independência.

Depois da vitoria, John Witherspoon, representando New Jersey na Convenção da Filadélfia, propôs formalmente a Suíça como modelo de confederação. Madison escreveu que as maiores influências na constituição americana foram Vattel, Burlamaqui, Montesquieu e Locke, embora tanto ele quanto Hamilton, cada um por seu viés, criticassem o sistema suíço pela ausência de um poder central mais forte que consideravam essencial à sobrevivência da democracia americana num mundo ainda totalmente adverso.

Os suíços, por sua imprensa e sua academia, também sempre acompanharam com o máximo interesse a revolução americana. Invadida por tropas francesas em 1798, a Suíça viu abolida a independência dos cantões. Restituída a independência passou os 40 anos seguintes debatendo o modelo americano. Em 1815 a soberania dos cantões estava restabelecida mas eles eram controlados por oligarquias. Em 1830 a revolução em Paris favoreceu a queda dessas oligarquias. Abriu-se então o debate da mudança do sistema de governo.

Paul Vital Troxler, líder dos “americanistas”, dizia que “a constituição dos EUA é uma obra de arte que a inteligência humana criou baseando-se nas leis eternas da divina natureza” e “um modelo para a Suíça e todas as outras repúblicas”. Os tradicionalistas, igreja católica à frente, resistiam. Os cantões dividiram-se num movimento secessionista que tinha paralelo com o que se insinuava nos Estados Unidos. Em 1847 um movimento militar deteve o conflito iminente e convocou uma constituinte. Em 1848 ratificaram uma constituição que embora volumosa comparada à original – tinha 147 artigos e 7 disposições transitórias – baseava-se na americana e estabelecia um federalismo de dupla soberania com um sistema bicameral como o deles: um Conselho de Estados como Senado, com dois votos por estado, e o Conselho Nacional, comparável à Câmara, eleito pelo povo. Em vez de um executivo único instituiram um conselho de 7 membros e uma suprema corte sem poderes de rever as leis passadas no Legislativo.

A diferença, segundo um autor, “é de DNA”: nos Estados Unidos uma aristocracia, movida pelas circunstâncias, criou uma constituição para atalhar os poderes dos estados independentes; na Suíça ocorreu o exato contrário; forças democráticas forçaram a criação de um governo central forte para se impor às aristocracias que tinham passado a mandar nos cantões.

A Suíça acompanhou a Guerra de Secessão americana consciente de que o seu resultado seria decisivo para ela própria. Em 1863, quando pareceu que o Sul estava ganhando, publicou-se por lá o “Manifesto de Berna”:

Do vosso lado do oceano agora levanta-se renascida uma grande e poderosa republica, superior a todos os seus inimigos. Com suas próprias forças os americanos venceram a doença que arruinou as esplêndidas republicas da antiguidade. Rejuvenescida, a republica americana instala-se para a eternidade, como o modelo e o escudo da liberdade. Ela será livre no futuro e para toda a História. Ninguém mais pode negar que as republicas podem existir em países de muita extensão. Essa vitória é um marco para a humanidade”.

Quando a “disrrupção” provocada pela “ferroviarização” do continente americano e a explosão da corrupção pela associação entre os robber barons dos albores da revolução industrial e seus monopólios e os políticos corruptos num país institucionalmente despreparado para enfrentá-los corroeu todo o apoio popular à democracia, foi a vez dos americanos voltarem-se para a Suíça para reconstrui-la. 

As ferramentas do recall e da iniciativa e referendo de leis eram desconhecidas do grande publico nos Estados Unidos até 1888 mas usadas na Suíça desde 1847. A partir de então surgem os primeiros trabalhos semi-acadêmicos sobre o sistema suíço. Seja qual tenha sido a faísca que iniciou o incêndio, o interesse pela Suíça começou a correr como fogo na macega na década dos 1890s. Entre 1891 e 1898 houve mais de 70 publicações sobre o assunto. Mas foi a imprensa que fez a revolução. O sistema suíço passou a ser o tópico jornalístico mais quente da década. Nenhum editor podia ignorá-lo e vários jornais e revistas mandaram equipes à Suíça para a execução de reportagens e estudos extensos.

A Suíça virou a meca de todos os reformadores e cientistas políticos e literalmente todos os americanos alfabetizados foram expostos ao tema que, finalmente, Theodore Roosevelt e o Partido Progressista encamparam. Isso os ensinou que antes do início da introdução desses instrumentos, nos 1830s, a Suíça estava dividida entre senhores e servos, plutocratas despóticos e políticos corruptos que exploravam o país servindo-se do sistema representativo, e que com sua adoção “o parasitismo político simplesmente desapareceu, as máquinas políticas ficaram sem uso, as leis foram re-escritas em linguagem que qualquer leigo podia entender, os impostos foram reduzidos e os privilégios dos monopolistas vieram ao chão”.

Em 1898 South Dakota foi o primeiro estado a adotar iniciativa e referendo. Utah foi o segundo em 1900 e Oregon o terceiro em 1902. Em 1912 ja eram 18. Entre 1913 e 1918 mais 5 estados aderiram. 

As duas guerras mundiais sufocaram o espírito reformista. Mas ele viria a reviver com a Proposition 13 da California em 1978 que iniciou uma rebelião nacional contra impostos abusivos. Hoje da esfera estadual para baixo nos Estados Unidos, e em todas as esferas, inclusive a constitucional, na Suíça, tudo e cada vez mais é decidido diretamente pelos eleitores que, não por outra razão, tornaram-se os mais bem educados e ricos do mundo.

Marcado:

§ 16 Respostas para Em democracia nada se cria, tudo se copia

  • É totalmente definidor o conceito de “entre iguais” que se organizam consensualmente para governarem-se. Definitivamente não foi o caso da formação de nossa sociedade e que faz toda a diferença, explicando assim a dificuldade de exercermos cidadania. Falta-nos a educação e prática da vida cidadã.

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    • Embora induzidas de cima as Câmaras Municipais portuguesas viveram, sim, em boa medida, essa democracia expontânea dos povos isolados. No Brasil, durante mais de 300 anos ininterruptos, esses governos municipais eleitos, sem nenhuma quebra na regularidade das eleições, prouveram tudo aos seus governados: segurança, defesa, abastecimento, comércio, etc.

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      • Obrigado por responder.
        Infelizmente é um período que perdeu-se com o tempo. Em complemento posso dizer que, vivendo há muitos anos em Portugal, atualmente a prática da cidadania nas autarquias municipais é praticamente nula.

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      • Certo também…

        A democracia requer trato permanente e pode perder-se na virada de uma ou duas gerações se não for cultivada como Ronald Reagan nunca se cansava de lembrar.

        Mesmo cuidando bem do culto à História é muito fácil isso acontecer numa geração cevada na facilidade, conforme demonstra o que se passou entre as que viveram as guerras mundiais e as que vieram depois na Europa e nos EUA…

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  • rubirodrigues

    Grande artigo. Observe-se que embora os elementos, povo e cultura, confiram matizes próprias ao processo, mantido o sentido natural das coisas – leis da natureza – as coisas se encaminham no sentido certo. Estou convencido que a receita certa está indicada na natureza e o fato inquestionável de ela ter gerado consciência, deveria convencer-nos da eficácia dessas leis e da necessidade de entendê-las corretamente para navegar tranquilamente e sem susto pelo universo.

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  • Essa história é inspiradora, mas nossas lideranças demonstram resistências para avançarmos em questões muito mais comezinhas, além do que, não vejo nenhum movimento prático nesse sentido além deste seu valioso blog.

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  • Alexandre

    A Declaração da Independência dos Estados Unidos é realmente uma obra-prima, e o trecho destacado pelo Fernão é sua parte mais sublime. (E pensar que agora também querem “cancelar” a estátua do Jefferson…)

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  • Sim. O inimigo nao titubeia e mira precisamente os seus alvos…

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  • FRANCISCO G NOBREGA

    Maravilhosa aula de história da democracia. Obrigado!

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  • FERAX MANUTENÇÃO E MONTAGENS INDUSTRIAIS LTDA.

    Parabéns pelo instrutivo e brilhante artigo. A épica história dos “Founding Fathers” é inspiradora e invejável. São a base da grandeza americana. Oxalá Moro consiga catalizar nossa nação para caminharmos rumo à decência, educação, progresso, honestidade e justiça, sem privilégios, sem parasitas e respeitando todos os seres vivos que habitam nossa pátria.

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  • Jackson

    Grande texto Fernão. Elucidativo, histórico e de nos encher de inveja de vivermos num “semi-presidencialismo” tupiniquim.
    O Brasil não é para amadores e essa frase nunca esteve tão atual, foi uma quinzena de barbaridades dos “11 homens e um destino”, rasgaram o texto constitucional (ruim mas é o que temos) com a instituição do poder moderador para servir aos amigos que perderam no voto, pensar que o contribuinte pagou a semana em Lisboa pra turminha.
    Teve Moro lendo o discurso do FHC e a Dona do Banco Itaú falando que Lula é o cara (viu Obama o que vc fez).
    Acho que tudo isso é culpa do Cabral, devia ter tocado direto pras Índias. Ainda veremos mais capítulos dessa loucura institucional até 2022.

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  • Selma Santa Cruz

    Excelente reflexão, a partir de fatos e contextos históricos. Justamente o que mais falta hoje no nosso medíocre debate político. Há um trabalho hercúleo de educação a ser feito nessa área se se quiser tentar de fato destravar o país, não?

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  • rubirodrigues

    Há um trabalho hercúleo de conquista da razão e de uma racionalidade aderente à natureza que preside o desenrolar das coisas neste universo. A historiografia distingue Período Imperial, Idade Média, Modernidade e Pós-Modernidade ou era contemporânea, configurando um processo civilizatório evolutivo com modos de ser e de pensar crescentemente complexos. A superação de cada fase deu-se “naturalmente” sem perguntar aos homens – antigos detentores de poder -, se estavam ou não de acordo. O gatilho do próximo período já foi acionado pelo advento das redes sociais e o artigo do Fernão destaca valores dos quais a população não vai mais abrir mão. Pistas? As matemáticas de Pitágoras e de Platão. Talvez a Academia Platônica de Brasília a ser lançada em 2022 indique caminho mais amigável. Estamos em pleno renscimento.

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  • Marcos Andrade Moraes

    Muito bom, replicando. Ficaram duas dúvidas. A Suíça copiou de quem? Prouver?

    MAM

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  • Iza

    Obrigada, Fernao. Aprendendo sempre com vc.