Algumas pessoas inteligentes e principalmente honestas e
bem-intencionadas, se deixam levar pela lábia de “salvadores da pátria”. Muitos
destes “salvadores da pátria” são pessoas bem-intencionadas, mas acham que as
leis, que são o fundamento da democracia, podem ser desrespeitadas, o que, na
minha opinião, é um absurdo. Quem acha que a lei está errada tem de fazer
esforço para que seja alterada e não simplesmente descumpri-la.
No entanto outros “salvadores da Pátria” são mentirosos e
corruptos e acham que as leis podem ser desrespeitadas e, sob o pretexto
de fazer boas ações que auxiliem aos mais humildes, aproveitam-se do poder para
obter vantagens pessoais e para amigos e comparsas.
Se os nossos dirigentes
políticos tivessem um pouco de cultura ou pelo menos se dessem ao trabalho de
ler os clássicos, como por exemplo a Antígona de Sófocles e algumas obras mais
recentes como O Enraizamento (L’Enracinement) de Simone Weil, descobririam que
há algumas características pessoais que deveriam ser consideradas como
OBRIGATÓRIAS e portanto gerais (embora pessoais) PARA QUALQUER OCUPANTE DE
CARGO POLÍTICO OU DE FUNÇÃO GERENCIAL em qualquer nível. Estas características
“gerais” estão associadas aos VALORES (praticados)
e não ao conhecimento ou à personalidade.
Sófocles, há cerca de 2500 anos escreveu a Antígona, cujo
resumo é o seguinte:
Após a morte de Etéocles e
Polinices, Creonte torna-se regente. Ele deu a ordem para enterrar Etéocles,
que defendeu a cidade, mas ninguém deveria enterrar Polinices pois este último
tinha vindo para atacar Tebas, sendo considerado um inimigo. Antígona, irmã dos
dois irmãos e sobrinha de Creonte, recusa-se a cumprir a ordem de Creonte e decide
enterrar Polinices. Ao saber deste ato, Creonte a condena a morrer enterrada
viva em uma caverna. Quando ele percebeu seu erro, já era tarde demais: sua
sobrinha Antígona morreu, seu filho Hêmon se matou com ela, e sua esposa (Eurídice)
também se matou ao saber da morte de Hêmon.
Versão da
Wikipedia
A história tem início com a morte dos dois filhos de Édipo, Etéocles e
Polinices, que se mataram mutuamente na luta pelo trono de Tebas. Com isso sobe
ao poder Creonte, parente próximo da linhagem de Jocasta. Seu primeiro édito
dizia respeito ao sepultamento dos irmãos Labdácidas. Ficou estipulado que o
corpo de Etéocles receberia todo cerimonial devido aos mortos e aos deuses. Já
Polinices teria seu corpo largado a esmo, sem o direito de ser sepultado e
deixado para que as aves de rapina e os cães o dilacerassem. Creonte entendia
que isso serviria de exemplo para todos os que pretendessem intentar contra o
governo de Tebas.
Ao saber do édito, Antígona deixa claro que não deixará o corpo do irmão
sem os ritos sagrados, mesmo que tenha que pagar com a própria vida por tal
ação. Mostra-se insubmissa às leis humanas por estarem indo contras as leis
divinas.
Continuação da minha versão:
Antígona é uma obra literária que é válida até hoje
Para alguns Antígona representa um conflito
entre Direito Natural e Direito Positivo, para outros representa um conflito
entre família e Estado ou entre o âmbito privado e o âmbito público. Para mim
representa um conflito entre a Lei e o Amor. Segundo a Wikipedia, no português do Brasil a palavra "Creonte" possui conotação pejorativa.
No Jiu-Jitsu o termo creonte é utilizado para se referir a um lutador que é (ou é visto como) infiel a uma academia ou organização. No entanto, Creonte é justamente aquele que é fiel à Pátria.
Segundo a Wikipedia, na versão francesa, muitas vezes Creonte é interpretado como um tirano que aplica a lei de forma cega sem levar em consideração as circunstâncias particulares ou a opinião do povo.
Isso é verdade porque a lei era estabelecida exclusivamente por Creonte e não de forma democrática por uma maioria. Felizmente no Brasil ainda estamos em uma democracia representativa, que me parece a única forma de fazer com que as leis representem a vontade da maioria, em um país com mais de duzentos milhões de habitantes.
Por outro lado Creonte representa, no caso de uma democracia representativa, uma posição adulta de aceitação e compromisso com as leis estabelecidas, o que me parece ser a única posição possível em uma democracia, onde as decisões da maioria, representadas pela Lei, devem ser obedecidas, não assumindo portanto uma posição adolescente, idealista e intransigente de transgressão da lei, que impede a resolução dos problemas e leva a impasses.
Uma das falas de Creonte (na tradução francesa de André Bonnard da Antígona de Sófocles) mostra porque considero, no caso de uma democracia, a posição de Creonte não só uma posição adulta de aceitação e compromisso com as leis estabelecidas, mas principalmente a adoção de valores que sempre adotei em minha vida profissional:
“Vós não
conheceis nem meu
caráter nem
meus princípios.
SÓ SE CONHECE UM HOMEM QUANDO ELE ESTÁ
NO EXERCÍCIO DO PODER. Desde agora, vejam com
os meus atos
quem eu
sou.”
Todo o chefe
de estado (para
mim qualquer
um dotado de poder)
que por
medo da opinião
pública hesita em
dizer ou fazer o que ele acha que é o melhor,
eu o considerarei como
o último dos homens.
Eu amo
a minha pátria
e não os meus
amigos. JAMAIS A AFEIÇÃO QUE TENHO POR MEUS AMIGOS PASSARÁ À FRENTE DOS
INTERESSES DO PAÍS. JAMAIS EM
SITUAÇÃO DE PERIGO EU ESCONDEREI A VERDADE A MEU POVO. Eu,
o chefe CONDUZIREI A CIDADE PELO JUSTO
RUMO POIS ELE É a única salvaguarda de cada
um e também A GARANTIA DE MEU SUCESSO. QUANDO
O ESTADO É SÃO nós temos tudo nele, inclusive amigos. Sobre esses princípios eu
estabelecerei a grandeza de Tebas.”
Se desejamos um país verdadeiramente democrático é fundamental
que a Lei seja cumprida e que os políticos sejam os primeiros a respeitá-la.
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